A velha briga para determinar o que é fato e o que é lenda nos textos bíblicos acaba de passar por mais uma reviravolta -- e quem saiu ganhando foi o glorioso reino de Salomão, filho de Davi, que teria governado os israelitas há 3.000 anos. Escavações na Jordânia sugerem que a extração de cobre em escala industrial no antigo reino de Edom -- região que, segundo a Bíblia, teria sido vassala dos reis de Israel -- coincide, em seu auge, com a época do filho de Davi. Em outras palavras: as célebres "minas do rei Salomão" podem ter existido do outro lado do rio Jordão.
A pesquisa, coordenada pelo arqueólogo Thomas E. Levy, da Universidade da Califórnia em San Diego, está na edição desta semana da prestigiosa revista científica americana "PNAS" , e bate de frente com os que duvidam da existência de uma monarquia poderosa em Jerusalém durante o século 10 a.C. Segundo esses pesquisadores, como Israel Finkelstein, da Universidade de Tel Aviv, tanto a região de Jerusalém quanto a área de Edom, onde as minas foram encontradas, eram habitadas por uns poucos aldeões e pastores nômades nessa época. O surgimento de reinos politicamente bem organizados e capazes de empreendimentos de larga escala só teria sido possível por ali cerca de 200 anos depois.
Levy discorda. "O que nós mostramos de forma definitiva é a produção de metal em larga escala e a presença de sociedades complexas, que podemos chamar de reino ou Estado arcaico, nos séculos 10 a.C. e 9 a.C. em Edom. Trabalhos anteriores afirmavam que o que a Bíblia dizia a respeito disso era um mito. Nossos dados simplesmente mostram que a história de Edom no começo da Idade do Ferro precisa ser reinvestigada usando ferramentas científicas", declarou o arqueólogo ao G1.
A região escavada por Levy e seus colegas na Jordânia é uma velha suspeita de ter abrigado as famosas minas salomônicas. Nos anos 1940, o arqueólogo americano Nelson Glueck já tinha defendido a idéia. No entanto, foi só com as escavações em larga escala no sítio de Khirbat en-Nahas (em árabe, "as ruínas de cobre"), ao sul do mar Morto, que o tamanho da atividade mineradora ali ficou claro. Estima-se que, só em sobras da extração do minério, existam no local entre 50 mil e 60 mil toneladas de detritos.
Numa escavação iniciada em 2006, Levy e seus colegas desceram pouco mais de 6 m e montaram um quadro em alta resolução da história de Khirbat en-Nahas. A ocupação começa com uma estrutura retangular de pedra, com protuberâncias ou "chifres". "Pode ter sido um altar", conta o arqueólogo -- esses "chifres" eram usados como plataforma para besuntar o sangue dos animais sacrificados na antiga Palestina. Acima dessa estrutura, ao menos duas grandes fases de extração de cobre estão documentadas, com paredes de pedra que serviam como instalação industrial.
Uma das formas de datar a atividade mineradora é a presença de artefatos egípcios -- um escaravelho e um colar -- que aparentemente datam da época dos faraós Siamun e Shesonq (chamado de Sisac na Bíblia) -- o século 10 a.C. Mas os pesquisadores também usaram o método do carbono-14 para estimar diretamente a idade de restos de madeira usados para derreter o minério e extrair o cobre. O veredicto? O mais provável é que a atividade industrial na área tenha começado em 950 a.C., data equivalente ao auge do reinado de Salomão, e terminado em torno de 840 a.C.
E não é só isso: escavações numa fortaleza próxima também sugerem uma construção na era salomônica, durante o século 10 a.C. Segundo o relato bíblico, Salomão usou vastas quantidades de bronze (cuja matéria-prima, ao lado do estanho, era o cobre) na construção do templo de Jerusalém. Também teria continuado o domínio estabelecido por seu pai Davi sobre Edom e financiado uma frota de navios mercantes que saíam do litoral edomita em busca de produtos de luxo.
Levy diz que os dados obtidos em Khirbat en-Nahas são compatíveis com o quadro do Antigo Testamento, mas mostra cautela. "Se as atividades lá podem ser atribuídas ao controle da produção de metal pela Monarquia Unida israelita, pelos edomitas ou por uma combinação de ambos, ou até por um outro grupo, é algo que nossa equipe na Jordânia ainda está investigando", ressalta ele. [http://g1.globo.com/Noticias/Ciencia]
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